Um grupo de estudantes, activistas e parte de sociedade civil angolana, certamente do grupo de marimbondos e sem direito a serem recebidos (por falta de representatividade institucional) pelo Presidente João Lourenço, marcha hoje um pouco por todo o país, como forma de protesto contra o desemprego no país, acusando o Governo de “pouco ou nada” fazer.
Num documento enviado ao governador de Benguela, a organização do protesto nesta cidade lembra o “comprometimento” do partido no poder desde 1975, o MPLA, que no seu manifesto eleitoral prometia “a criação, no mínimo, de 500 mil novos empregos”.
“Não se vêem políticas públicas claras e/ou objectivas para o alcance destes 500 mil postos de empregos, e sem produção, sem empregos, não se vai melhorar a situação social e económica dos angolanos”, argumentam os promotores da manifestação.
Os cidadãos descontentes com o estado socioeconómico angolano pedem assim que a criação de “políticas públicas concretas e inclusivas voltadas à valorização do capital humano angolano”.
“Acima de tudo, é necessário devolver a esperança de ter um emprego condigno aos jovens”, assinalam.
“Se queremos combater a delinquência, devemos ocupar os jovens para que não tenham tempo de pensar em coisas negativas, mas sim em trabalhar para o progresso do próprio país”, lê-se na nota enviada ao governador Rui Pinto de Andrade, membro (obviamente) do MPLA.
A marcha de hoje surge cinco meses depois de em 7 de Julho de 2018 mais de uma centena de jovens ter protestado em Luanda pelas mesmas razões.
Em 22 de Julho de 2017, em plena campanha eleitoral para as eleições gerais de Agosto em Angola, João Lourenço, actual chefe de Estado, prometeu que, numa só legislatura, iria conseguir criar pelo menos meio milhão de empregos, reduzir um quinto à taxa de desemprego de 24% e instituir o rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema.
A acção de protesto em Luanda — estavam anunciadas idênticas manifestações nas províncias do Bengo, Bié, Benguela, Malanje, Moxico e Zaire — destinou-se, segundo os organizadores, a chamar a atenção para o facto de “90% da população jovem angolana estar desempregada”. Isto, é claro, para além dos 20 milhões de pobres.
“Esta realidade assusta”, dizia em Julho Viriato Cruz, 29 anos, desempregado há sete, apelando ao Governo para que incentive a criação de emprego para jovens, sobretudo na ideia de apoio às empresas no sector privado, uma vez que o Estado é o maior empregador do país e que “não chega para todos”.
“O Governo já poderia ter mostrado vontade para um maior investimento no sector privado. O Estado é o maior empregador, mas tem de mudar para aumentar as empresas no privado. Tem de ajudar, sobretudo em dar um crédito, não é só ter o cartão do partido (MPLA). João Lourenço é a continuidade de José Eduardo dos Santos e todas estas alterações são apenas uma fachada”, afirmou.
No mesmo sentido, Graciano Brincos, 29 anos, e também desempregado, refutou a ideia de ser ainda cedo para fazer estas exigências ao Governo – João Lourenço está há mais de um ano no poder -, defendendo que, em vez de diminuir, o desemprego está a aumentar.
É claro que um ano é pouco tempo. Se o MPLA está no poder há quase 43… anos e só conseguir empobrecer os seus escravos, JLo precisa de muito mais tempo para deixar o país… na mesma.
“Está tudo na mesma. Em vez de criar empregos e arranjar 500 mil empregos, estão a criar mais desemprego”, dizem os manifestantes.
Em Julho, na acção de protesto, em que se associaram oito dos 17 membros do Grupo que foi condenado a penas de prisão por alegada rebelião, tendo dois deles, Hitler Tshikonde e Arante Kivuvu, considerado que a mudança de Eduardo dos Santos para João Lourenço nada trouxe de novo.
“Considero que João Lourenço, tal como José Eduardo dos Santos, são partes do mesmo grupo e, havendo desemprego, eles são culpados e devem ser responsabilizados. João Lourenço faz parte de um grupo, de uma estrutura de uma estrutura apodrecida. É membro do MPLA, que governa o país há 43 anos. Todos os problemas que temos, ele também é herdeiro. Os desafios são os mesmos, mas ele prometeu criar os 500 mil empregos, prometeu criar políticas, mas nada mudou”, disse Tshikonde.
“Há mais índice de desemprego na juventude. Não nos sentimos realizados. Temos de chamar a atenção para criação de política de emprego. Se vamos esperar quatro anos sem chamar a atenção então é que tudo ficará na mesma. Há um número maior de pobreza extrema, que leva à delinquência e à prisão”, disseram quer Tshikonde quer Kivuvu.
A marcha de protesto de Julho, onde, entre outras, se ouviam palavras de ordem como “o trabalho é um direito” ou “o desemprego marginaliza”, começou no Cemitério de Santana e terminou cerca de cinco quilómetros depois, “às portas” da Praça da (In)dependência, onde não chegou a entrar devido a um forte dispositivo de segurança policial (tal como acontecia com José Eduardo dos Santos), que acompanhou a acção desde o início.
A criação de pelo menos (pelo menos, note-se, anote-se e relembre-se) meio milhão de empregos, reduzir um quinto a taxa de desemprego e instituir o rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema (temos apenas e graças à divina actuação do regime 20 milhões de pobres) foram propostas solenemente apresentadas e subscritas por João Lourenço.
Mas o MPLA está no poder há 43 anos e nos últimos 16 o país está em paz total, dirão os mais atentos e, por isso, cépticos. Mas o que é que isso interessa? Desta vez é que vai ser. A montanha nem um rato (made in China) vai parir. Mas o que realmente conta é continuar a ser dono do país. E disso o MPLA não abdica.
Estas medidas, entre várias dezenas, integraram o manifesto eleitoral do partido no poder desde 1975.
O discurso de João Lourenço é (já foi mais, é verdade) marcado por uma insistente propaganda de combate à corrupção (onde Angola está no top mundial dos mais corruptos), que diz colocar em causa “a reputação” de Angola no plano internacional.
“Se tivermos a coragem, a determinação, de combatermos a impunidade, com certeza que conseguiremos combater a batalha da luta contra a corrupção”, apontou o Presidente na República, na altura vice-presidente do MPLA.
Reduzir a taxa de incidência da pobreza de 36% (segundo as deficientes contas do regime) para 25% da população, do índice de concentração da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementar o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza” são – repete João Lourenço – objectivos. Como é que isso se consegue? JLo não explica. Nem precisa de explicar. Aos escravos basta saber que “o MPLA é Angola e que Angola é o MPLA”.
“Erradicar a fome em Angola”, aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando-a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidade infantil (a maior do mundo segundo organizações internacionais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados-vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço.
Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificação nem de explicações sobre a forma de serem cumpridas.
No plano económico, e com o país a tentar recuperar da crise financeira, económica e cambial de 2015 e 2016 (que só atingiu os angolanos de segunda categoria), João Lourenço avisou que as empresas públicas deficitárias serão entregues à gestão privada, para que deixem de “sugar os recursos do erário público”.
Não fosse apenas mais um capítulo do anedotário do regime e, certamente, os angolanos até ficariam sensibilizados com essa de “sugar os recursos do erário público”. Por outras palavras, promete acabar com aquilo que, ao longo de 43 anos, foi a única estratégia do seu MPLA: “sugar os recursos do erário público”.
Entre os fundamentos macroeconómicos, JLo promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromisso de atingir uma média de crescimento anual “não inferior a 3,1%” do Produto Interno Bruto (PIB), reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não-petrolífera.
Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligência dos angolanos e a passagem de um atestado de matumbez também às organizações internacionais que dão cobertura ao regime, mostrando que preferem trabalhar com um governo corrupto e ditatorial do que com um sério e democrata.
Sobre a criação de 500 mil novos empregos em cinco anos, João Lourenço diz que será concretizada pela capacitação do empresariado privado, mas sem apresentar uma medida concreta. Ele bem perguntou aos seus assessores políticos, nomeadamente portugueses e brasileiros, como é que isso se alcançaria. Mas eles apenas responderam: “Não se preocupe, os escravos são matumbos”.
Folha 8 com Lusa